segunda-feira, 9 de abril de 2018

O DESAPOIO CULTURAL




Em Portugal a Cultura vive num momento conturbado e a origem está na contestação das companhias profissionais de teatro, que ficaram excluídas do concurso de atribuição de apoios plurianuais da Direcção Geral das Artes.
Pelo que consta, o estado atribuiu um plafon de 62,5 milhões de euros para as artes perfomativas a distribuir por quatro anos, sendo que, desse valor, 26 milhões são destinados ao teatro.
Na área do teatro, das 89 candidaturas apresentadas, 39 foram excluídas, sendo que, entre estas, se encontram companhias de referência, como o Teatro Experimental de Cascais, a Seiva Trupe ou o Teatro Experimental do Porto.
Face à contestação o ministro da cultura e o próprio primeiro ministro, já anunciaram um reforço da verba em 2 milhões de euros.
A cultura é o permanente parente pobre, sempre que que é preciso cortar nos gastos do estado. Esquecem-se os nossos governantes que é a cultura que nos dá identidade, um povo sem cultura não passa de um conjunto de pessoas…!
É por isso confrangedor o desprezo, a que a cultura é votada pelos diversos poderes instituídos.
Mas socorrendo-nos da matemática e fazendo contas simples, obtemos dados estatísticos interessantes…
  • 26 milhoes de euros a dividir por 4 anos dá 6,5 milhões de euros por ano.
  • 6,5 milhões divididos equitativamente pelos 50 contemplados, dá 130 mil euros a cada um.
  • Ora se cada companhoa contemplada produzir 3 espectaculos por ano isso dá 43333 euros por cada espectaculo.
  • Se cada espectaculo fizer 20 representações por ano (o ano tem 52 semanas!), cada representação gastou 2166 euros.
  • Se cada representação tiver, em média, 100 espectadores (numero que parece razoável considerando que os bilhetes têm um custo não inferior a 5 euros) significa que o espectaculo foi visto por 2000 pessoas.
  • 2000 vezes 3 espectaculos anuais, representa 6000 espectadores, isto admitindo o caso, extraordinário, de cada espectador ver apenas um dos espectaculos.
  • 6000 vezes 50 companhias dá 300000 espectadores
  • Considerando que Portugal tem 10 milhões de habitantes, o estado, com o apoio às companhias profissionais de teatro, garantirá “cultura teatral” a 3% da população….
  • O que significa que o teatro chega, à imensa maioria que resta, através dos grupos de teatro amador…
    Pois é….!
    O teatro amador garante o acesso à cultura a 97% da população e é mesmo o único a chegar às populações rurais e do interior, porque as companhias profissionais estão radicadas nos grandes centros urbanos.
  • Os Plebeus Avintenses, nos últimos três anos, produziram 8 espectaculos de teatro. E no ano corrente preveem produzir mais 5, estando dois já em produção e dois em pré-produção.
  • Nesses três anos Os Plebeus Avintenses receberam, de apoio público, 2800€ da junta de freguesia, 500€ da DRCN e 1550€ da Fundação Inatel, o que totaliza 4850€.
E assim percebe-se que para garantir a cultura a 3% da população o estado apoia com milhões…
Para a cultura dos outros 97% o estado contribui com uns míseros tostões…!
Claro que isto é uma “estatistica” e as estatísticas são aquilo que nós quisermos… Só que a matemática é um ciência exacta….!
E se os dados podem ser discutíveis, porque existe parte da população que, apesar de ter acesso, não vê teatro, por opção…
Mas mesmo que consideremos que 50% da população portuguesa não gosta de teatro e, por isso, não deve servir para inflacionar a estatística, as companhias profissionais duplicariam a sua percentagem…. de 3% para 6%… o que continue a ser uma imensa minoria…!
Nas produções artísticas o lucro deve ser uma consequência e não um objectivo…
Os artistas não podem ser pedintes e tem que ter meios de subsistência, que lhes permitam uma estabilidade financeira que os faça desenvolver o seu trabalho cultural, sem estarem condicionados pela necessidade de pagarem as suas despesas correntes. E não podem estar sujeitos à tentativa de controlo e manipulação dos poderes instituídos, o que acontece se estiverem dependentes deles para sobreviver…
O relevante trabalho cultural realizado pelas companhias profissionais, ora excluídas, deve ser reconhecido e apoiado pelo estado… Isto, obviamente, se o trabalho é relevante e visa contribuir para o desenvolvimento cultural da população…
Mas também o trabalho realizado pelos grupos de teatro, dito amador, deve ser reconhecido pelo estado. Porque são eles quem garante o acesso democrático à cultura, a toda a população e não apenas a elites intelectuais…
E a diferença do trabalho desenvolvido está essencialmente no facto de uns, os profissionais, receberem pelo seu trabalho, o que é inteiramente justo, os outros, os amadores, tendo que custear o trabalho que fazem por paixão.
O reconhecimento do estado ao teatro amador deve ser consequente, certamente que perante critérios previamente definidos e face a projectos devidamente fundamentados… Mas tem que ser real, não podem ser apenas tostões nem limitar-se a comendas e louvores…
Por isso, enquanto Presidente d’Os Plebeus Avintenses e do seu grupo de teatro amador que está a comemorar o centenário, manifesto total solidariedade, às companhias profissionais de teatro que foram excluídas dos apoios estatais…
Mas manifesto também total solidariedade a todos os grupo de teatro amador que, com poucos apoios e muito esforço e sacrifício, vão continuando a garantir que o Teatro está acessível a todos os portugueses.
Viva o teatro!
José Manuel Araújo
(Presidente da Direcção)